A heroína mais popular da DC ganhou uma nova publicação com
tratamento de luxo no Brasil. Mulher-Maravilha:
Terra Um tem 148 páginas, capa dura e traz uma equipe criativa de renome,
com Grant Morrison, um dos mais criativos roteiristas do mercado editorial e o
responsável por recontar a origem da personagem. Os desenhos são de Yanick
Paquette e as cores, de Nathan Fairbairn. Os três, juntos, criaram um dos
melhores episódios da personagem desde que foi criada. O roteiro não tem
enrolações, os desenhos estão lindos e são muito bem preenchidos com as cores
de Fairbairn.
Visual mescla o clássico com moderno, rico em detalhes
A trama começa com o semideus grego
Hércules fazendo a rainha Hipólita se ajoelhar perante ele, com uma multidão de
mulheres enjauladas como testemunhas. Ao tentar estuprá-la, porém, a realeza
consegue inverter o jogo e matá-lo. Ela liberta suas
protegidas e diz que dali para frente, nenhum homem interferirá em seu reinado.
A história tem um salto de 3 mil anos, vindo para os dias atuais, mostrando a
história da filha da rainha na Ilha Paraíso. A princesa anseia por conhecer o
mundo, mas é proibida pelas leis do local.
Porém, ao encontrar um piloto da força aérea americana
ferido na ilha, ela decide ajudá-lo e foge para o continente, local de origem
dele. Com isso, ela é mal vista pelas moradoras da Ilha e caçada por elas. A história não tem muita ação, mas é dinâmica, acontece
bastante coisa. Em 148 páginas, vemos o motivo do isolamento das amazonas, a
origem da Mulher-Maravilha, sua rebeldia, fuga para o mundo dos homens e
retorno ao lar. Sem esquecer também uma série de referências à mitologia grega,
não deixando para trás uma das características mais marcantes do universo da
personagem.
Estilo arquitetônico da Ilha é visivelmente grego
Os traços são bastante interessantes. No começo, quando
vemos apenas a Ilha Paraíso, parece que todas as personagens são desenhadas com
o mesmo corpo. Ao levar a história para o continente, porém, as pessoas têm corpos
mais flácidos ou magros, o que causa espanto à Mulher-Maravilha, que está
acostumada a ver apenas mulheres grandes e fortes. Aliás, ela mesma talvez
tenha sido desenhada em uma de suas versões mais robustas. É uma mulher grande
e com estrutura bastante larga.
Diana se desespera ao ver mulheres doentes do continente
A Ilha é um cenário que à primeira vista parece bastante
absurdo, por ser uma mescla de paraíso natural com uma espécie de sonho erótico
do autor. Com mulheres guerreiras, fortes e sem nenhum homem à vista, é um
local não apenas de combates e prosperidade, mas também de libertinagem e bebidas.
As mulheres claramente têm relações lésbicas de forma desinibida. Na verdade,
isso é uma referência a Esparta. Muitos arquivos históricos apontam que os lendários
soldados, cercados apenas por homens durante anos e anos, passavam a praticar
relações homossexuais com os companheiros de batalha.
Com isso, Grant Morrison aproveita para dar um tom
fetichista à história. Em certo ponto, a protagonista oferece ao piloto uma
coleira de couro com espinhos de metal para que ele use e se ajoelhe perante
ela. Além disso, a princesa passa parte da história acorrentada, totalmente
dominada por suas captoras. Se levarmos em consideração que na Ilha as mulheres
são desenhadas muitas vezes em poses mais provocantes e temos a sexualização da
mulher, isso pode ser visto como um ponto bastante negativo na história. Afinal,
além da objetificação da mulher, em dois momentos vemos uma mulher dominada,
humilhada. E o mesmo não acontece com os homens. Mesmo no início, quando
Hércules é morto, ele não é humilhado.
Mulher-Maravilha subjulgada por suas companheiras
Os autores perderam a oportunidade de criar um hino
feminista nesta obra. Apesar disso, o encadernado tem muitos pontos positivos. A
história é interessante, a protagonista é carismática, belíssima e a arte é um
espetáculo. Os cenários são lindos, ricos e detalhados. A Ilha Paraíso faz jus
ao nome, com cores vivas e traços que dão ar de futurismo a uma Grécia antiga.
O trio de autores entrega ao leitor uma das melhores releituras da personagem,
que merece uma continuação, talvez se impondo mais no mundo dos homens e
mostrando sua força em um mundo patriarcal.
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