A Marvel Comics escancarou, durante este final de semana,
sua pior crise após a quase falência total nos anos 1990. Em uma reunião com os
maiores lojistas de quadrinhos dos EUA e um do Canadá, Axel Alonso, editor-chefe
da Casa das Ideias, e David Gabriel, vice-presidente de vendas e marketing,
informaram que gostariam de entender melhor os motivos da diminuição drástica
das vendas da empresa. Esta foi a maior reunião da Marvel com o mercado no século
XXI e a cobertura foi feita exclusivamente pelo veículo ICv2.
Os motivos, além de muitos, são alarmantes e afetam toda a
estrutura da editora. Mas fica evidente que foi apenas agora que soou o alarme
da empresa, afinal, dos 15 quadrinhos mais solicitados pelos lojistas em
fevereiro deste ano, apenas um (Amazing Spider-Man) é de um personagem forte da
Marvel Comics. A lista é praticamente dominada pela DC e dois dos títulos, Star
Wars Darth Maul e Star Wars, são produzidos pela editora, mas não são dos
personagens tradicionais da casa.
Lembrando que, nos EUA, o mercado de quadrinhos funciona por
meio de solicitações dos lojistas e quando eles não vendem, são eles mesmos que
lidam com o prejuízo. Portanto, a lista de quadrinhos encomendados reflete
quase que com perfeição a procura e vendas das HQs.
Para entender os motivos da baixa das vendas, a Marvel
chamou os lojistas, pois são eles que lidam com o consumidor final. Segundo os
vendedores, um dos principais pontos a ser observado é a diversidade promovida
pela editora. A Marvel tem tentado há anos se modernizar e levantar a bandeira
da igualdade entre todos no universo dos quadrinhos, introduzindo mais personagens
negros, homossexuais e árabes, por exemplo. Porém, o que se percebeu é que o público
consumidor é conservador.
De acordo com os lojistas, os compradores têm reclamado
muito da descaracterização dos personagens clássicos, como o Capitão América,
que passou a ser o Falcão Negro, o Thor, que atualmente é uma mulher, e tantos
outros. O mundo real, conservador, homofóbico, encontrou o mundo dos quadrinhos.
A Miss Marvel, que atualmente é uma árabe, está em uma fase positiva, com
críticas e vendas consideradas boas para a editora, mas esse é um ponto fora da
curva, não um exemplo.
E como se não bastasse esse problema, outro bastante grave é
que os leitores estão desinteressados pelos reboots ou reinvenções de personagens
clássicos, trazidos, em geral, por grandes sagas e eventos. Em meados dos anos
2000, época da Queda dos Vingadores, esses acontecimentos costumavam ser
anuais. Hoje em dia, existem tantos eventos que eles ocorrem simultaneamente,
sem espaço de tempo entre eles, com personagens participando de mais de um ao
mesmo tempo. Além de confundirem os leitores, isso gerou desinteresse e o
público fiel parou de acompanhar seus personagens favoritos, por estarem
diretamente ligados a esses eventos. O mais recente é o Secret Empire e Alonso fez questão de
dizer que não há mais nenhum planejado depois deste.
Não bastasse isso, reiniciar os números das HQs, começando
tudo pela edição #1, funciona a princípio, mas para por aí. Segundo Alonso, imediatamente
após o reboot, as vendas aumentam muito. Quando as vendas começam a despencar,
outra saga surge e reinicia tudo novamente. Mas aí o estrago já está feito e o
leitor já ficou completamente desinteressado.
Outro ponto bastante grave apontado pelos representantes do
mercado foi a falta de competência de segurar as melhores equipes criativas na
casa. Se olharmos superficialmente, as duas empresas que dominam o mercado,
Marvel e DC, vendem praticamente o mesmo produto, com histórias de super-heróis
e ação. Com isso, os trabalhos autorais ficam de fora da jogada. Por isso, os
times criativos de mais talento preferem ir a outras editoras, colocar seus
trabalhos autorais para apreciação do grande público. Com um mercado mais
seleto, menor custo de distribuição e contratos que favorecem mais os artistas,
empresas como a Image conseguem “roubar” os talentos da Marvel, oferecendo
contratos mais lucrativos para os artistas, apesar das vendas menores.
Tudo isso converge para um ponto. O mercado de quadrinhos
sempre foi muito fechado e tentou atingir as mesmas pessoas por décadas. Agora,
é necessário se reinventar. Buscar a diversidade não funcionou, nesse momento.
Pode até ser que funcione no futuro. A DC, por exemplo, para melhorar as
vendas, recriou seu universo e trouxe os personagens da forma que eram antes,
com leves alterações.
Sem ter uma fórmula correta do que fazer agora, aumentando
as vendas, mas sem se fechar novamente em uma bolha, buscando coisas
diferentes, a Marvel tem um caminho muito difícil e imprevisível. Deve haver um
grande chacoalhão por parte dos editores. A publicidade e marketing da empresa
também precisam se reinventar, para atingir públicos que não atinge hoje. Toda
a estrutura deve ser alterada se a editora quiser fazer um papel diferente no
mercado, pensando não apenas nas vendas de agora, mas se planejando para o
futuro.
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